A descoberta

Juliana Pellicer Ruza
3 min readJun 4, 2021

Foi o café que me fez ir atrás do teste de gravidez. Não podia ser diferente, acho eu. O café me acompanha desde pequena. Em quantidades cavalares, coado ou espresso, mas sempre no começo e no meio do dia. Fosse o clima que fosse, estava eu lá com minha xícara.

Apesar de não esperar mais que um bebê chegasse naturalmente, eu monitorava os sinais do meu corpo em busca dos sintomas, do momento certo de tentar mais um pouco. Depois de anos de tentativa, eu acabei me convencendo de que essa era só uma brincadeira que eu fazia comigo mesma, enquanto esperava o ciclo recomeçar. O que eu estava sentindo era fruto de ansiedade, mas eu já sabia que na semana seguinte tudo se resumiria a marcar o período no aplicativo e continuar o jogo.

Acordei num dia daqueles me arrastando pela casa. Desempregada, tinha ido dormir tarde fuçando em sites para estruturar um plano B para minha vida profissional. E me sentia mal, com os sintomas de uma gripe que não ia embora.

– Nossa, preciso de um café. — minha fala de todos os dias nem abalou meu marido que continuava se arrumando para ir atender um cliente.

Logo o aroma delicioso invadiu a casa. Mas me pareceu esquisito, o que atribuí à falta de olfato típica da sinusite atacada. Depois de pronto, fui me aconchegar no sofá da sala para finalmente saborear a bebida e começar oficialmente o dia.

No primeiro gole senti um gosto de metal. No segundo, já não pude mais beber. O líquido desceu queimando por dentro e na mesma hora o deixei de lado com uma careta.

Naquela hora meu marido se espantou.

– Você não consegue tomar café? Entra no carro agora. Vamos comprar um teste de gravidez.

Minha reação imediata foi rir. Ele mal sabia quando era meu período fértil, quanto mais se havia chances reais de eu estar grávida. Mas ele estava tão decidido a tirar a história a limpo que eu me troquei e fomos.

– Imagina só, se eu descubro que estou grávida bem agora que eu não tenho emprego e nem convênio médico?

– Só pode ser gravidez. Rejeitar café?

A hipótese de um pré-natal particular ou pelo SUS nem foi falada. Eu já não sabia se ele estava torcendo para eu estar grávida para ele me provar o argumento ou se estava ansioso para o sonho se tornar realidade. Os gastos a gente vê depois, ele disse.

Na farmácia, o impasse. Eu não estava nem atrasada, então como fazer um teste? O poço de ansiedade que atende pelo nome de meu marido não ia conseguir esperar uma semana até a menstruação descer e eu provar que ele estava errado.

Depois de procurar bastante encontramos o teste que lê o resultado até quatro dias antes do atraso. De acordo com os três aplicativos que eu usava para monitorar o meu ciclo, era exatamente o dia seguinte.

No dia seguinte eu pulei cedo da cama. Nem dormi direito, óbvio, Dei graças a Deus pelo cansaço não afetar o resultado do teste e, dez segundos depois de a urina ter contato com o palitinho, lá estava uma cruzinha azul.

Grávida.

Hã? Grávida?

Eu desaprendi a andar naquela hora. Consegui chegar no quarto uns dez minutos depois. A cruz cada vez mais forte. Então era verdade mesmo. Nossa! Nem acredito!

Vou processar melhor a informação e depois eu o acordo pra contar, pensei. Puxei as cobertas e virei de lado, pronta para esperar o despertador dele tocar.

Só não contava com o fato de que ele também não tinha conseguido pregar o olho.

– Fez o teste?

Duas horas depois eu já estava de novo dentro do carro, atrás do laboratório que entregasse o resultado em menos tempo. Eu queria a confirmação, vai que o teste está com defeito?

O café não tomei mais. Só quatro meses depois, quando os enjoos davam lugar à barriga que já começava a querer aparecer.

--

--